quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Juntos

Estava na altura de criar novas pegadas na areia. Iam em frente … em direção ao futuro … pois seria lá que encontraria novos sentimentos, novas experiências e, acima de tudo, novas pessoas.
Ao longe, observava as pegadas marcadas na areia, tal como as memórias que ficaram escritas no fundo do meu ser. Mas, à medida que caminhava, a água acabava por cobri-las, desvanece-las. Via essa marca a desaparecer no longo caminho na areia que tinha construído.
Ao meu lado, surgiam novas pegadas na areia, com um caminho tão diferente mas simultâneamente tão idêntico. Mas... porque raio se cruzariam? Seria destino? Coincidência? Só os deuses o saberão…
Via que caminhávamos na mesma direção, com o mesmo destino: caminhávamos rumo a um barco que nos aguardava no horizonte perdido. Barco aquele que só entraríamos se ambos tivessemos força para remar.
Iríamos navegar por águas desconhecidas e nunca iríamos desistir daquilo que mereciamos: a felicidade!
A certa altura senti-me fraquejar. Como que ficar sem fôlego. Na verdade não consegui dar nem mais um passo e caí desamparada na areia, sem que nada nem ninguém me segurassem. Do outro lado ouvi uma voz indignada mas ao mesmo tempo angelical, que me disse:
- “Nem penses que espero por ti. Se queres desistir e olhar para as pegadas que foram o presente mas agora são apenas passado, força! Entrarei no barco sozinho, sem hesitar! Nem penses que espero ou caminho ao lado de quem é fraco ao ponto de desistir tão facilmente, porque eu vou à procura daquilo que necessito para ser feliz: e nada me irá parar. Não tenho medo do desconhecido, porque acabei de sair do abismo e estou mais forte que nunca! Estás disposta a morrer na praia?? Eu não"
Não me senti com forças para responder. Foi aí que senti que ele me agarrara e me arrastara consigo. Chegámos bem perto do pequeno batel e foi aí que ele me questionou:

- "Está na hora da decisão… saltas ou ficas??"
Ele mexeu com o meu orgulho. Mas eu não consegui, algo do outro Mundo me prendia. Estava imóvel...
Ele nem hesitou: saiu, remou contra a forte maré e em minutos desapareceu na neblina...


Parei, sentei-me na areia.
Fiz uma escolha. Colhi um erro. O erro de não ter embarcado. O erro de querer continuar as malditas pegadas já construídas.
O caminho foi curto mas muito intenso, como nunca tinha sido. Mas eu não me esquecia do barco que tinha abandonado, a nova rota a seguir, aquela que, onde alguém que me aguardava na outra costa, teria que rezar ao horizonte para que este barco chegasse, este barco que me ajudaria a fazer a transição da ilha sonhadora que havia construído, para a ilha da verdadeira realidade.
Ainda continuo a andar perdida naquilo que escolhi: continuar as pegadas da nossa vida. Mas não consigo continuar a delinear na areia o esboço do meu ser, enquanto o teu desaparece pouco a pouco com o seguir da caminhada…
Parei. Contemplei a minha história, a nossa história. O meu caminho era firme e seguro, sempre numa direcção. O teu? Já se havia desvanecido à muito pois um amor só resiste, se forem os dois a amar incondicionalmente…

E ele? Aquele ser fantástico?
O que será feito? Terá ele sobrevivido? Estará ele bem, feliz e realizado por ter decidido sair desta ilha e enfrentado tudo, sozinho? Terá sido essa a sua melhor opção?
Pois ele... continuaria à deriva. Derivando lentamente até à morte: o barco jamais chegaria a terra firme, a raspar num qualquer grão de areia. Restou apenas uma vastidão de mar aliada a uma imensidão de nada. O arquipélago em que nós estávamos era demasiado isolado, demasiado complexo para qualquer outro dos mortais se aproximarem. Excepto eu e ele... Nós.
Ele acabou por falecer em viagem, completamente desnutrido. Morreu, pois estava sozinho. A viagem era longa demais e no fundo ele sabia-o: não ia conseguir fazê-la sem companhia, sem a mão que ele outrora pediu que o acompanhasse, a minha mão. Assim a história se desfez, tal como o amor: tão diferente, tão igual.


André Simões dos Santos e Inês Tomé - 2012/2013

sábado, 24 de novembro de 2012

"Fluvius Mondae"

Falo-te enquanto te miro, maior pérola da região Centro de Portugal.
 

Desde o teu nascimento, da Serra da Estrela até à Figueira da “tua” Foz e passando pela inigualável cidade de Coimbra: é este o teu curso e percurso. Abasteceste populações durante séculos, que se estabeleceram pela tua dádiva. Teu nome traz lenda, presença e magia a toda uma cidade, a toda uma região e a todo um país.

Miro-te. Incidem sobre ti os reflexos das luzes e, na água, a projecção do maior símbolo da minha e tua cidade: a torre da “Cabra”. As tuas águas passam sem destino. Limitam-se a seguir o seu curso e a ir em frente, sabem lá para onde. Não tens objectivo, não pensas, não sentes. Mas despertas em mim e em todos os conimbricenses pensamentos e sentimentos únicos. Consegues fazê-lo sem ter conhecimento, sendo simplesmente tu mesmo. Invejo-te.

És um dos meus maiores orgulhos. Marcas a cidade assim como as pessoas que banhas e que em ti se banham, seja num simples e refrescante mergulho ou numa inevitável consequência “universitária”.
 
Contigo vivi, vivo e viverei o amor, tal como os tão desgraçados Pedro e Inês, imortalizados na ponte que sobre o teu eixo seu amor eterno reencontram. O amor é desgraçado, mas ao mesmo tempo a coisa mais bonita e singela do universo. Contigo sorri e contigo chorei, Mondego.

Vá para onde for, irás fazer-me companhia. Nas memórias, para onde quer que eu vá, vou recordando tais e todas tão formosas peripécias. Tenho e terei toda a coragem de dizer seja onde for seja a quem for que sou de Coimbra, que nasci e cresci em Coimbra e de mãos dadas o Mondego, com todo o orgulho. Porque ser de Coimbra é ser diferente. É ser maior e melhor. É ser único

sábado, 3 de novembro de 2012

A minha "Nostalgia de Infância"


É Primavera: o apogeu da natureza e da criação. O Sol começa a desaparecer no horizonte, em tons vermelhos e laranja, enfraquecido. Decido abstrair-me da desgastante rotina do dia-a-dia por um só instante e deambular nesta rua quase vazia. Tento encontrar uma razão dentro de mim para me sentir mínimamente feliz, mininamente realizado... Tento. Não sou capaz.
Aquilo que chamo vida torna-se meditação constante, a música transforma-se em nostalgia no meu pensamento. A rua estreita e eu resolvo sair dela. 
Encontro-me a mim mesmo sentado no banco de um jardim. Toda a natureza parece dizer-me algo, rodeando-me e fascinando-me com a sua imponência e com o seu esplendor tão característico. Flores desabrocham, 'bichos' correm numa azáfama para tentar retirar da natureza o máximo que ela lhes possa fornecer: tudo em prol da sua singela sobrevivência.
Subitamente algo me tira o pensamento. Espera... Sinto algo no ar. Sinto um aroma deveras familiar e especial que já há bastante tempo não sentia. Este aroma doce e aconchegante faz o meu inconsciente angustiar-se da fragilidade da vida e da curta vivência da mais rica fase da existência do ser-humano: a sua juventude.
Toda esta especialidade remete-me para um lugar no passado que fiz como que uma viagem. Lembro-me de momentos, instantes, pessoas. "Lembro, lembro, lembro. Mas porque não vivo? Porque não posso voltar atrás?" 
Gostaria de reviver o meu primeiro dia de aulas, o meu primeiro beijo e lugares e circunstâncias em que vivi o meu primeiro amor. Lembro-me de inúmeros momentos marcantes e até de outros que à partida não teriam razão para marcar, mas marcaram. Era esta a altura perfeita do meu ser, onde tudo era novidade para mim: quando acordava todos os dias desejoso de ver os desenhos animados e o meu eterno amor era a bola de futebol.

Dou por mim a pensar como é fugaz a juventude, como é tão curta a vida. Vivemos milhões de momentos, mas são raríssimos os que nos fazem perceber os verdadeiros valores, os que nos fazem mudar de atitude e crescer enquanto pessoas. Sinto que a vida é breve. Sinto que é demasiado pequena para algum dia eu poder afirmar que valeu a pena. A infância pode não ficar para a eternidade mas algo ficará bem presente: a vontade inesgotável de voltar atrás e reviver tudo de novo. Reviver como se fosse pela primeira vez.


Oh minha juventude,
Recordar é viver,
E eu vivo,

Recordando-te


terça-feira, 30 de outubro de 2012

Poema - "Pedra da Calçada"

Como primeiro post da minha nova página de produções escritas, deixo-vos com o primeiro poema de sempre que redigi e com o qual concorri recentemente à iniciativa 15_25 para a a categoria de poesia dinamizada pela revista "Ler". Desde já obrigado por verem e espero que gostem!



 A noite cai leve e breve. 
Com ela vem a melancolia,


 E apodera-se o silêncio.
 Contemplo-te, fascinado.

A ti, solitária pedra desta calçada.
 Foste nada e tudo.
 Foste tudo e nada.
 Quão ingrato não é o mundo?
 
Quantos embriagados em ti tropeçaram? 
 Quantos casais por ti alegremente caminharam?

 Quantos revoltosos sobre ti se manifestaram,
 E quantos absortos te ignoraram?

 Estás sozinha, impotente, enrugada,
 De um tempo que não te fez nada.
 Continuas triste e desapoiada,
 À espera da Revolução. Ela tarda...

 Oh! Como te invejo... Tu viveste
 A história, testemunhaste a farsa!
 É este o teu Fado: 
Seres outra pedra desta praça.